Saúde

"O legado de cada um de nós é um farol para quem vem atrás. Vocês não estão sozinhos"

Por PCV Comunicação e Marketing Digital

01/12/2020 às 07:11:06 - Atualizado há
Médico dá depoimento emocionado e emocionante em evento sobre a velhice LGBT+ “Era uma vez um garotinho nascido na década de 1940, no bairro de Copacabana. Que não gostava de jogar bola, ou de brincar de revólver, como os outros meninos. Aos 8 anos, sua mãe o chamou para uma conversa "séria", quando disse: "antes um filho morto do que um filho homossexual". Embora não soubesse o significado da palavra, imaginou que deveria ser algo muito grave para a mãe preferir a morte”. Esse foi o começo do relato de Alexandre Kalache, ex-diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS) e uma das maiores autoridades brasileiras sobre o tema, num seminário sobre velhice LGBT+, realizado no sábado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Rio de Janeiro.

Relato pouco usual e que mobilizou os que assistiam ao evento on-line. Era como se Kalache estivesse contando a história de vida de diversos participantes. Apesar de, ano após ano, ser eleito representante da turma, o menino sofria um bullying cruel na escola. Sabendo da sua fobia por baratas, colegas implacáveis às vezes colocavam um inseto cascudo em seu colarinho, zombando enquanto ele se contorcia. Vivia paixonites platônicas e se perguntava: “só eu sou assim?”. Na faculdade de medicina, foi convencido a fazer psicanálise para se tratar – até 1990, a homossexualidade estava na lista de doenças da própria OMS.

Alexandre Kalache: “o legado de cada um de nós é um farol para quem vem atrás”

Reprodução TV Globo

Vieram a militância política, o casamento, dois filhos – o que chama de “primeira metade da minha vida”. Aos 37 anos, conheceu Paul, seu companheiro até hoje. “No dia em que o conheci, percebi que minha vida tinha mudado para sempre”, afirmou Kalache, emocionado e emocionando todos que acompanhavam a transmissão. O título de sua palestra, “Difícil ter saído do armário, ser enfiado de volta é cruel”, traduz o drama de muitos que, na velhice, são obrigados a ocultar a orientação sexual e abrir mão de uma identidade conquistada a duras penas. No entanto, encerrou sua fala com uma mensagem de esperança: “o legado de cada um de nós é um farol para quem vem atrás. Vocês não estão sozinhos e não nos enfiaremos de novo no armário”.

Michael Adams, CEO da Sage, organização que existe há 42 anos e é a mais antiga entidade de defesa dos idosos LGBT+, gravou um vídeo no qual declarava: “nos recusamos a ser invisíveis”. Nos EUA, são 4 milhões atualmente, com a previsão de, em 2040, atingirem a marca de 7 milhões. Segundo ele, o estudo do envelhecimento desse segmento é o estudo do estigma e da discriminação, mas também da resiliência. Adams lembrou que, apesar de a Suprema Corte norte-americana ter reconhecido o casamento entre pessoas do mesmo sexo, os números mostram que a velhice é mais solitária para essa comunidade: “há o dobro de chances de envelhecerem solteiros ou sozinhos, o risco de não terem filhos é quatro vezes maior, além de quase sempre estarem desconectados de sua família de origem”.

A Sage investe em iniciativas como centros comunitários, rede de moradias acessíveis e treinamento com certificação para profissionais que lidam com idosos. “Não há sequer consciência de que existem”, lastima Adams, acrescentando: “70% das ILPIs (instituições de longa permanência) são privadas e 80% têm administração religiosa, o que torna o cuidado e respeito aos idosos LGBT+ bem desiguais. Nossa meta é criar uma legislação para garantir seu acesso a todos os serviços destinados aos idosos norte-americanos”. O jornalista Yuri Fernandes foi outro que, aos 13 anos, ouviu da mãe que ela preferiria se matar a ter um filho gay. Mineiro de Ipatinga, hoje se dedica a “ecoar as vozes dos mais velhos”. Autor da websérie “LGBT+60: corpos que resistem”, cujos episódios estão disponíveis no YouTube e na plataforma do Projeto Colabora, diz que é preciso lutar contra a rejeição todos os dias: “o impacto na saúde mental é tremendo e o governo tem que criar políticas públicas específicas para essas pessoas”. No sábado que vem, a SBGG-RJ fará nova rodada sobre o envelhecimento LGBT+. Que outras entidades sigam o exemplo!
Fonte: G1/PB
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