Paraíba

Paraíba em disputa: os 390 anos da guerra em que Espanha, Portugal e Holanda duelaram em Cabedelo

Por PCV Comunicação e Marketing Digital

05/12/2021 às 11:49:09 - Atualizado há
Se nos dias atuais o Forte de Santa Catarina é um aprazível museu a céu aberto, no passado já foi palco de uns dos confrontos mais violentos do período colonial. Que envolveu três potências europeias em busca do direito de produzir açúcar para o mundo. O Nordeste visto por um outro ângulo: no século 17, região foi palco de guerras sangrentas

Georg Markgraf/KONB01_1049B13_092_X/Biblioteca Nacional dos Países Baixos

São cerca de 1.600 holandeses (ou neerlandeses, como preferem muitos historiadores). Eles desembarcam no que hoje é a Praia de Formosa, em Cabedelo, município litorâneo da Grande João Pessoa. Montam um acampamento. E tão logo for possível, marcharão com mosquetes em punho em direção ao Forte de Santa Catarina, distante dali um quilômetro e protegido por ibéricos aquartelados (à época, Espanha e Portugal formavam a União Ibérica). Estão determinados a tomar a fortificação o quanto antes. E se julgam prontos para uma batalha rápida e vitoriosa. É uma manhã de sexta-feira, 5 de dezembro de 1631, exatos 390 anos atrás. É também o início da “Batalha do Cabedelo”, na continuidade de uma guerra sangrenta em que os Países Baixos (nome oficial do que no Brasil se convencionou a chamar de Holanda) tentavam se fixar naquelas terras coloniais do Atlântico Sul.

Aliás, é curiosa essas distinções que o tempo provoca num mesmo espaço. Se hoje o forte é um local aprazível e ensolarado, uma espécie de museu a céu aberto e acessível a pessoas de todos os países, de todas as idades, em que a entrada é permitida a partir da compra de um ingresso que custa apenas dois reais, naquela época a situação era bem diferente.

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Uma guerra estava em curso no território paraibano. E a diferença entre perder e vencer consistia justamente em conseguir transpor os limites da fortificação, num processo bem mais desafiador, custoso e mortal naqueles tempos. Tratava-se, pois, de uma batalha violenta e que deixou centenas de mortos de ambos os lados.

Forte de Santa Catarina nos dias atuais: um museu a céu aberto que esconde um passado violento

Clara Rezende/G1

Na verdade, o 5 de dezembro é apenas um dos marcos possíveis para contar toda esta história. A guerra já havia começado bem antes em outras partes do Nordeste brasileiro e se arrastaria para bem depois, mas esse é o dia em que finalmente ela chega à Paraíba.

O g1 conversou com dois especialistas sobre a presença holandesa no Nordeste brasileiro. O professor Bruno Miranda, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, que tem doutorado na Universidade de Leiden, dos Países Baixos, e que é o autor da tese “Gente de Guerra: origem, cotidiano e resistência dos soldados do exército da Companhia das Índias Ocidentais no Brasil (1630-1654)”; e o pesquisador Leandro Vilar Oliveira, da Universidade Federal da Paraíba, cuja dissertação, “Guerras luso-holandesas na Capitania da Paraíba (1631-1634): um estudo documental e historiográfico”, trata justamente destes conflitos iniciais em terras paraibanas.

Vê-se, portanto, até pelas datas que aparecem nos respectivos trabalhos, que se trata de um estado de beligerância extremamente prolongado, que vai trazer uma série de mudanças ao cenário do Nordeste brasileiro. Mas foi justo naquele dia de dezembro de 1631 que o temor da guerra retornou à Paraíba, apenas poucos anos depois do apaziguamento dos conflitos entre ibéricos e povos Potiguara, após o longo e violento processo de conquista da Paraíba pela União Ibérica.

A guerra no Nordeste: holandeses enfrentam a armada mais poderosa do mundo em busca de açúcar

SK-A-1361/Museu Imperial dos Países Baixos

A fundação da Companhia das Índias Ocidentais

Toda essa narrativa começa dez anos antes da invasão holandesa às terras paraibanas, quando, em 1621, era fundada, pelos Países Baixos, a Companhia das Índias Ocidentais. Na verdade, o nome oficial daquele território à época era República das Províncias Unidas dos Países Baixos. Tratava-se de uma série de províncias (o nome Holanda, na verdade, designa apenas uma dessas províncias) que viviam sob o jugo ibérico e que havia se unido justamente para tentar se desvencilhar desse domínio.

As animosidades contra os ibéricos em território europeu, portanto, não eram novidades. Tinham começado décadas atrás, na verdade. E depois de 12 anos de tréguas, que foram de 1609 a 1621, os conflitos estavam de volta. Mas, com a fundação da Companhia, os holandeses queriam levar a disputa para um outro patamar. Para outros mares. Para o outro lado do Atlântico.

De acordo com o professor Bruno Miranda, tratava-se de uma companhia de comércio privado, que recebe uma patente para atuar no chamado “espaço atlântico”. É montada com capital privado, mas recebe autorização holandesa para atuar em áreas do Atlântico ocupadas por espanhóis e portugueses à revelia desses governos.

“É uma companhia com fins comerciais. Mas não se faz comércio em terras coloniais que não são suas de forma pacífica”, explica Bruno Miranda.

Ele destaca ainda que, desde o início, o grande foco era lucrar fortemente com a produção e a comercialização do açúcar, à época um produto caro e que era conhecido como “ouro branco”. E, para se fortalecer no concorrido mercado açucareiro, os holandeses viam o Brasil como território ideal. “Era preciso cravar uma cabeça de ponte no Brasil”, atesta.

Formação de tropa com mosquetes do exército ibérico: antes do comércio, a guerra

Gerry e Sam Embleton/Reprodução/Dissertação de Leandro Vilar Oliveira

O professor explica que aquela era uma época ainda de muitas turbulências na colônia, em que o domínio ibérico era frágil e seguidamente questionado por outros países. E os Países Baixos, confiantes na própria capacidade bélica, estavam dispostos a mudar essa realidade o quanto antes.

“É possível pensar o Brasil enquanto espaço de disputas políticas e econômicas. Em que os Países Baixos chegam atrasados e vão questionar o direito de espanhóis e portugueses de dividir o mundo entre eles. Chegam atrasados na disputa, mas entram de cabeça”, prossegue Bruno.

Não era uma tarefa simples, nem muito menos barata. Era necessário montar uma armada e um exército. Atravessar o Atlântico. Travar guerra no Brasil com as possíveis resistências. Avançar no processo de conquista. Para só depois ter os meios para explorar economicamente a região.

A estratégia, contudo, não era aleatória. Certos ou errados, o fato é que os responsáveis pela Companhia das Índias Ocidentais acreditavam que o Brasil era precariamente guardado por portugueses e espanhóis (a União Ibérica só vai se desfazer em 1640) e, em sentido contrário, eles tinham altíssima expectativa de lucros nesses territórios.

Mas, não havia ilusões. Para se fazer comércio, antes era necessário fazer a guerra:

“Comércio é uma coisa, guerra é outra. Mas as duas se misturam”, alerta Bruno Miranda.

As guerras no Nordeste do século 17 foram representadas por vários pintores europeus

P00654 1634/Museu do Prado

Levou-se tempo para montar a primeira frota. A Companhia só fez sua viagem inaugural em 1624. E zarpou direto para Salvador, a então sede do Governo Geral no Brasil. Invadiram a capital, venceram a batalha, tomaram a cidade para si. “Tomaram Salvador com muita facilidade”, comenta Bruno. Mas, depois disso, o avanço foi contido.

As forças holandesas nunca conseguiram deixar o perímetro urbano. Sofreram um cerco firme e, em seguida, foram atacados por uma poderosa armada luso-espanhola que provocou a capitulação inimiga. A primeira aventura holandesa em terras brasileiras durara apenas um ano.

A guerra ronda a vizinhança

A Companhia das Índias Ocidentais precisou recomeçar. Reconstruir suas estruturas, sua frota, suas forças. Levou algum tempo, mas o processo foi considerado relativamente rápido, a julgar tudo o que precisava ser feito e refeito. Em 1629, mais uma vez os navios rumaram ao Brasil, chegando ao Nordeste em 1630. O alvo desta vez? A capitania de Pernambuco, maior produtor de açúcar do mundo à época. "Se bem que não eram muitos os locais do mundo que naquele período produziam açúcar", brinca Bruno.

De toda forma, a guerra é retomada. E de forma intensa. “Eles tomaram Olinda com bastante facilidade, porque a topologia da região tornava difícil defender a cidade. Em mais 15 dias, tomaram o porto de Recife. Mas e aí? Ficaram cercados, não conseguiram avançar território adentro”, prossegue Bruno.

Conquista de Olinda pelo general Hendrick Loncq em 1630

RP-P-OB-79.395/Museu Imperial dos Países Baixos

A partir dessa nova incursão, muito tempo vai passar. Bruno Miranda explica que, de início, os ibéricos chegaram a pensar que se tratava de mais um dentre tantos saques que existiam naqueles tempos. Chegaram a oferecer uma carga de açúcar em troca deles irem embora. Mas o aviso foi seco, direto, pouco fraternal. Daquela vez, eles tinham chegado para ficar.

“Estamos falando de uma movimentação gigantesca de gente. Ao longo dos anos seguintes, os neerlandeses chegaram a enviar até sete mil homens para o Nordeste brasileiro”, destaca.

A resistência ibérica em Pernambuco, ainda de acordo com Bruno, é comandada por um homem chamado Matias de Albuquerque, que adota um tipo de tática de guerrilha que evita o confronto direito, ao tempo que impede o avanço dos inimigos. “A tática é simples. Bate e recua. Bate e recua. Bate e recua. Isso causava insegurança. Os invasores não avançam. Fortificam-se no Recife”.

Neste período, os holandeses em Pernambuco incendeiam totalmente Olinda e se concentram em Recife. Ficam isolados, cercados, totalmente dependentes das provisões e dos reforços que chegam da Europa, visto que eles não alcançam nenhuma fonte de recursos econômicos em terras nordestinas. Para resolver o problema, pensam em ampliar sua área de ocupação e assim aliviar o cerco vigente. É neste momento que os holandeses se voltam à Paraíba.

“Eles precisavam solidificar a presença deles no Nordeste. E pensam a Paraíba como opção para fundar uma outra cabeça de ponte”, comenta Bruno.

Tela de 1662 do pintor Frans Jansz Post de Olinda: cidade foi totalmente incendiada em 1630

Frans Jansz Post/SK-A-742/Museu Imperial

O ataque contra a Paraíba

O pesquisador Leandro Vilar Oliveira, que se debruçou especificamente nos anos iniciais da guerra entre holandeses e ibéricos em território paraibano, conta que a Paraíba desde o início foi um dos alvos prioritários da Companhia. Mas, justo por não ser o único (além de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia e até Rio de Janeiro estavam na mira), o momento exato do ataque contra a Paraíba ainda era uma incógnita.

“Não havia consenso sobre quando atacar a Paraíba. Mas a parte que prevaleceu decidiu que deveria-se atacar logo, porque seria um local mais fácil de conquistar. Esse foi o erro deles”, frisa Leandro Vilar.

Ele pondera também que a Paraíba servia de apoio ao cerco contra Recife, de forma que a região tornava-se estratégica para ambos os lados. Por fim, ele explica que existiam documentos que apontavam a Paraíba como produtora de um açúcar de melhor qualidade com relação ao de Pernambuco, o que também gerou a cobiça dos holandeses.

A região do ataque tinha três fortificações. O Forte de Santa Catarina, em Cabedelo, único que ainda existe; o Forte de Santo Antônio, localizado na margem oposta, onde hoje fica o município de Lucena; e o Reduto da Restinga, uma fortificação de menor porte na Ilha da Restinga, também em Cabedelo. Os três formavam um triângulo defensivo que seria difícil de transpor.

A entrada do rio: Forte de Santa Catarina à esquerda, Forte de Santo Antônio à direita, Reduto da Restinga na ilha ao centro

Rio Paraíba e Cidade Frederica/Arquivo Nacional da Haia/NA, VEL 619-84

É por isso que os holandeses decidem desembarcar na Praia de Formosa e atacar o Forte de Santa Catarina. Seria a forma de tomar a principal das três fortificações sem ficar na mira das demais.

Em 1º de dezembro de 1631, os holandeses realizam um culto em Recife em que pediam sorte no combate que estava por vir. No dia seguinte, a frota holandesa com 16 navios e 1.600 homens deixam o porto do Recife. No dia 4, eles chegam à Praia de Cabo Branco. A invasão é ordenada para a manhã do dia 5, em Formosa.

A troca intensa de tiros de canhões e de mosquetes começa ainda na praia. E já no desembarque são registradas baixas. O combate vai durar todo o dia. Tem uma segunda investida à tarde, uma terceira à noite. Os ibéricos querem impedir a todo o custo a tomada da praia, mas ela acontece. Os holandeses montam o acampamento, cavam trincheiras, se organizam para iniciar a ofensiva.

É a realidade nos dias seguintes. Batalhas sangrentas, muitas mortes e feridos, avanço dos holandeses rumo ao forte. No quarto dia, a propósito, a Fortaleza de Santa Catarina já está perto da exaustão, mas acaba recebendo provisões oriundas de quatro caravelas portuguesas que retomam os ânimos das forças defensivas.

Ainda assim, seis companhias holandesas cercam o forte pouco depois. Atravessam o fosso seco existente no local e chegam às paredes da fortificação. Parece iminente a vitória, mas os ibéricos resistem. Com canhões e mosquetes, com uma intensificação brutal da violência. São inúmeros os mortos naquele dia. Os holandeses não conseguem transpor as paredes do forte.

Forte de Cabedelo, fundado em 1589: palco de uma das batalhas mais sangrentas do período colonial

Reprodução/Tese de Sylvia Brito

Não havia mais o que fazer. Os sobreviventes recuam, exaustos. No dia 11, ficam meio desnorteados, sem ter mais forças para um ataque tão intenso. No dia 12, estarão de volta aos navios e de lá voltarão a Recife. A invasão da Paraíba fracassa em apenas sete dias.

“Foi uma batalha muito violenta, de trincheira. Foram usadas naqueles dias estratégias parecidas daquelas que seriam utilizadas na 1ª Guerra Mundial, quase 300 anos depois”, indica Leandro. “Ao serem expulsos das portas do forte, eles perceberam que a invasão não era nada simples”, completa.

Resistência paraibana

Nos anos seguintes, as ofensivas holandesas vão prosseguir em outros alvos. Os holandeses vão conquistar Itamaracá em 1631 e lá construirão o Forte Orange. Depois, em 1633, vão invadir com êxito o litoral do Rio Grande do Norte. A Paraíba, assim, fica isolada. Volta a virar alvo. E volta a ser atacada em fevereiro de 1634.

“A Paraíba fica ilhada. Os aliados de ambos os lados são conquistados. Ela era a próxima. Já existia a percepção de que haveria guerra. As guarnições ficam em guarda na Paraíba ao longo de todo o ano de 1633, mas o ataque só acontece entre 26 e 28 de fevereiro do ano seguinte”, descreve Leandro.

A estratégia desta vez é atacar o outro forte, o de Santo Antônio, em Costinha, uma espécie de distrito do que hoje é Lucena. São mais 1.500 homens em 21 navios. E a tática é a mesma. Fugir do triângulo defensivo e eliminar um forte de cada vez. Em Lucena, novo acampamento, num local que, não à toa, no futuro ficaria conhecido como Praia do Holandês.

No fim das contas, todavia, foi uma nova derrota holandesa. Com mortes e baixas de ambos os lados. Mas, desta vez, Leandro explica que o erro foi mais de comando, mais de estratégia, do que de superioridade de poder dos inimigos ibéricos. “Os holandeses receberam a notícia de que haveria uma movimentação em terra com o objetivo de cercá-los. Isso faz com que o alto comando cometa alguns erros nas decisões e recue”, explica, ponderando que é essa recuada que sacramenta a derrota.

A Paraíba, no fim das contas, só vai capitular no fim de 1634. Após outra batalha brutal entre ibéricos e holandeses.

Ilustração sobre o período da guerra mostra a precariedade da mira dos canhões

Fototeca Alemã/Reprodução/Dissertação de Leandro Vilar Oliveira

O surgimento da cidade de Frederica

A guerra no Nordeste brasileiro é um processo complexo. Por exemplo, Bruno Miranda explica que os povos indígenas tiveram papel fundamental também em todo esse processo, ainda que muitas vezes sejam colocados de lado. Mas ele aponta que, naquela época, eles estavam sempre se posicionando, negociando de um lado e de outro, fazendo alianças e participando da guerra.

Ele destaca, por exemplo, o “papel central” dessas populações no conflito. E cita os povos Potiguara como aliados dos holandeses na Paraíba. Não por uma postura passiva ou subserviente, mas por estratégia mesmo, por antever a possibilidade de voltar a ter liberdade em seus territórios.

Esse exemplo ajuda a ilustrar melhor tudo o que se viveu naqueles anos do século 17. O Brasil holandês não é um processo estático, definido por marcos históricos, tal como foi ensinado por muitos anos nas escolas. E é por isso que trabalhos como o de Bruno (que se concentra no cotidiano da soldadesca neerlandesa de baixa patente) e o de Leandro (que esmiúça as batalhas na Paraíba) são tão importantes. Descortinam um lado humano, ainda que muito mais cruel, do processo histórico que levou duas nações europeias (três, se considerar que a União Ibérica era formada por Espanha e Portugal) a guerrear em território nordestino, tão distante de casa.

Combate entre holandeses e ibéricos: pintura da época ilustra a participação indígena nos conflitos

0017/Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira

A propósito, a derrota dos ibéricos na Paraíba, em dezembro de 1634, esconde algumas nuances sobre esses imponderáveis da guerra. Primeiro que ela acontece em meio ao aniversário de três anos da primeira batalha. Depois, a tática que se torna vencedora é justo aquela que os holandeses tanto temiam nos dois primeiros ataques.

“Depois de duas derrotas, eles arriscaram tudo na terceira”, comenta Leandro Vilar Oliveira.

Pois, em 4 de dezembro de 1634, iniciava-se o ataque derradeiro. Desta vez, com mais de 2.300 soldados, inúmeras embarcações de todos os tamanhos. Montam acampamentos nas duas margens da enseada, atacando simultaneamente os dois fortes (Santa Catarina e Santo Antônio). Mas é na madrugada do dia 9 que o movimento decisivo é realizado, quando navios holandeses avançam por entre os dois fortes e tomam o Reduto da Restinga.

Estava quebrado o triângulo defensivo. E, com a posição das tropas holandesas da forma como estava posicionada, o trânsito entre os fortes, com o envio de provisões de um lado para o outro, estava suspenso. Seria iniciado um cerco. Lento, penoso, com o objetivo de minar as forças ibéricas até o esgotamento total.

“É a tática de tensão. Bombardear o inimigo e fazer os recursos se esgotarem. Impedir que as pessoas entrem e saiam. Manter o inimigo dentro do forte, não permitir entrada de recursos e deixar que comida e água se esgotem. Vencer o oponente através do esgotamento”, detalha Leandro. “É uma guerra de cerco. Em que você tenta matar o seu inimigo de fome. Até ele se render”, completa Bruno.

Pintura de 1614 de Adriaen Pietersz van de Venne já apontava as tensões religiosas que existiam nos conflitos entre os neerlandeses protestantes e os ibéricos católicos

Adriaen Pietersz van de Venne/SK-A-447/Museu Imperial dos Países Baixos

Foi o que aconteceu ao longo de mais de 20 dias. Até que o fim estava decretado. “O cerco foi tão devastador, que os fortes resolveram se render. Acabou comida e munição”, detalha Leandro.

A rendição dos dois fortes aconteceu em 22 de dezembro de 1634. O dia seguinte foi de ocupação das duas unidades militares e de aprisionamento dos sobreviventes. Na véspera do Natal daquele ano, o exército holandês marcha em direção ao centro da cidade de Filipeia de Nossa Senhora das Neves (o nome do que hoje é conhecida como João Pessoa).

Em sua dissertação, Leandro Vilar descreve aquele dia lúgubre: “Ao chegar por volta de meio-dia, o exército holandês se deparou com uma cidade em silêncio. O forte do Varadouro havia sido abandonado e alguns canhões haviam sido jogados no rio e outros levados embora”.

A população de pouco mais de 500 habitantes havia evacuado a cidade e apenas um homem permanecera por lá. Nos dias seguintes, os fugidos ainda tentaram organizar uma última resistência, mas ela nunca foi levada a cabo. Principalmente porque os holandeses enviaram comunicados dizendo que a população civil poderia retornar, que seriam respeitados o direito à propriedade, o direito ao porte de arma, à liberdade religiosa, desde que a população local reconhecesse a autoridade holandesa.

Assim, surgia a cidade de Frederikstad. Ou Frederica, o novo nome dado àquela que antes se chamava Filipeia. Uma homenagem a Frederico Henrique, o Príncipe de Orange. E uma forma de ataque simbólico aos inimigos ibéricos, visto que o nome anterior era uma homenagem ao rei Filipe II de Espanha. Uma realidade que vai intercalar momentos de paz e de retomada da guerra e que vai durar até 1654, quando os holandeses serão definitivamente expulsos do Nordeste brasileiro.

Mapa holandês sobre a cidade de Frederica no século 17

Universidade de Leiden/Reprodução/Tese de Sylvia Brito

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Fonte: G1/PB
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